quarta-feira, 15 de julho de 2015

Sorte de Cabra




O texto que se segue é do meu Capitão João Vila-Chã.
O meu bem haja a todos!



Estávamos em Zalala, finais de 1963, em últimos preparativos para uma operação de grande envergadura do Vale do Rio Vamba, com duração de vários dias.

À CART. 422 fora atribuída a missão mais arriscada, exigindo a mobilização máxima da sua capacidade operacional. Vivia-se uma atmosfera preocupante, porque não dizê-lo, um ambiente de "cagaço", sobretudo por parte dos responsáveis pelo planeamento, mais conhecedores dos perigos e resistências a vencer.

Da defesa do aquartelamento, chefiada pelo 1º Sargento Veiga e Furriel Vaguemestre Bouçon, cuidariam os cozinheiros, mecânicos e os operacionalmente incapazes. Nem o médico, Dr. Joaquim Alves, foi poupado. Teve que seguir para operação, desta vez na mata e não no hospital. E foi assim que o famoso Costa teve oportunidade de fazer uma guarda, de noite, no posto de sentinela da porta de armas, próximo das bananeiras, ao lado do campo de futebol que, por se tratar de um espaço mais aberto e com a vantagem de uma noite de luar transparente, via-se a grande distância.

Enquanto os operacionais tentavam adormecer, fugindo aos maus pressentimentos da guerra, ouve-se um disparo de arma estranha aos nossos ouvidos. O Capitão levanta-se em sobressalto, corre na direcção da detonação. Certamente que os terroristas - mais tarde guerrilheiros - talvez tivessem entrado no nosso segredo operacional e estariam a criar problemas de movimentação à coluna militar que se preparava para sair dentro de duas horas.

Já perto do Costa, O Furriel Bouçon procurava serenar os ânimos. O Capitão inquiria o sentinela Costa sobre a situação.

O diálogo foi o seguinte:

Capitão - Que se passa Costa?
Costa - Ela vinha na minha direcção e atravessou a ponte. E eu disse: "Quem vem lá, faça alto!", e ela não parou.
Capitão - E depois?
Costa - E depois fiz como o nosso Furriel mandou: "Quem vem lá faça alto, uma; Quem vem lá faça alto, duas; Quem vem lá faça alto, três. Se não paras, atiro!" Como já estava perto de mim, pumba! E ela fugiu para o meio das bananeiras. Eu só tinha a bala que o nosso Furriel tinha metido na "Mauser".
Capitão - E ela estava armada? Como estava vestida?
Costa - A cabra vestida... Era bonito!
Capitão - Então Costa, tu...!
Costa - Então, eu sou o 1º Cabo Miliciano Furriel da Lenha, não admito brincadeiras e não é a cabra que brinca comigo!

Assim, e mais uma vez, se safou a cabra da CART. 422. E foi assim que o Costa fez entrar nas conversas de caserna a famosa situação de "Sorte de Cabra".

Para todos, um abraço do vosso Capitão João Vila-Chã.

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